MINHA SOLIDÃO NÃO É SUCATA.
No dicionário a palavra tem um significado interessante: Estado de quem está só.
Mas, na vida, esse substantivo feminino possui uma palheta de tons e cores praticamente infinita.
Solidão de ideias, de crenças, de pares e ímpares. Solidão não identificada, solidão escancarada, solidão velada, observada, invejada, desprezada, amaldiçoada.
Solidão tem mão pesada. Quando faz carinho, é bruto; Quando cutuca, deixa marca; Quando coça, arranha; Quando bate, nocauteia; Quando domina, enlouquece.
A minha solidão é cíclica, intempestiva, volúvel. Nunca consegui identificar se é regida pelas fases da lua, pelas estações do ano, ou pelas variações do meu humor.
Horas me sinto só de dar dó. Outras, nem sei o que é isso. Mas ela é real e universal. Todo mundo se sente só em algum momento!
O estado de solidão é muito mais do que não andar de mãos dadas, não usar uma aliança, morar sozinho, não ter família ou não ser exatamente uma pessoa popular.
Solidão é viver com a incompreensão, morar com o egoísmo, compartilhar sentimentos com egos inchados e exaltados, ter voz e não ser ouvido, questionar, pedir, suplicar e não ser atendido. Solidão é se reconhecer só justamente quando não gostaria. É ter espaço para mais uma presença, embora acompanhado de ausências.
A solidão mais cruel é aquela que pode contar com uma companhia que não enche o coração. Solidão dolorida, acompanhada mas ignorada.
É a solidão sucateada, vendida por uma promessa de companheirismo, uma condição social, uma vida calculada, desejada, ensaiada, mas de longe aproveitada.
Pensando em tudo isso, de vez em quando eu liberto minha solidão para que sofra, doa e chore, para que eu me lembre e valorize minhas boas e caras companhias, procure por elas, peça colo e carinho, ombros e ouvidos generosos. E dessa forma eu consigo negociar novamente com a solidão. Fazemos um trato cumprido com honestidade. Eu a consolo e ela não me domina.
E, se eu der algum passo da vida e isso for decisivo para fazê-la minguar, vou me despedir respeitosamente, prometendo deixá-la voltar algumas vezes, somente para um café com lembranças do tempo em que éramos inseparáveis.
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