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Latidos no centro cirúrgico


O primeiro hospital público para cães e gatos de baixa renda

Lince de Souza Soeiro estava prestes a entrar na faca. Sedada sobre a mesa cirúrgica, em breve teria um tumor retirado da parte lateral do tórax. Para aproveitar o ensejo, na mesma operação também teria o útero e os ovários removidos. O cirurgião Cauê Toscano, coordenador do serviço de cirurgia e oncologia, estava pronto para conduzir o procedimento ao lado de um auxiliar e de um anestesista. No andar de baixo, Osvaldo aguardava apreensivo. Com lágrimas nos olhos, dizia que, para ele, Lince era como uma filha, sua herdeira.
Às oito da manhã começaram os trabalhos cirúrgicos em Lince, uma dobermann de 9 anos, paciente do primeiro hospital público para cães e gatos do Brasil. Sediado no bairro do Tatuapé, na capital paulista, o Serviço Veterinário da Associação Nacional de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais de São Paulo oferece tratamento gratuito para animais de pessoas de baixa renda. Os serviços do Publicão, como é conhecido, abrangem áreas como endocrinologia, oncologia, oftalmologia, ortopedia e odontologia.
O hospital foi criado em julho do ano passado a partir de um convênio com a Prefeitura de São Paulo. Mensalmente, a Associação recebe até 600 mil reais, conforme a quantidade de consultas e cirurgias realizadas. O valor permite que os sessenta veterinários da equipe façam mil atendimentos e 400 cirurgias por mês.
Na cidade de São Paulo, há cerca de 3 milhões de cães e gatos com dono, segundo o Centro de Controle de Zoonoses. Não espanta que houvesse uma grande demanda reprimida por tratamento veterinário. Já de madrugada, é possível ver a fila se formando na frente do sobrado onde é feita a seleção dos pacientes do Publicão. Na primeira visita, Osvaldo chegou às três da manhã e pegou a senha de número 11. No processo de triagem, os donos têm que provar a participação em programas sociais do governo, como o Bolsa Família ou o Renda Mínima. A maioria dos atendidos vem de periferias e favelas, e não é raro encontrar ali moradores de rua com seus cães.
Na sala de espera do Publicão, a maltês com roupinha colorida e laço vermelho aguardava sentada ao lado de vira-latas impregnados com o cheiro da rua e gatos enrolados em volumosos cobertores listrados. Cauê Toscanodisse que os tumores estão entre as doenças mais tratadas no hospital e lembrou-se de quando retirou um de 10 quilos da musculatura abdominal de um cão. “Em algum momento esse tumor teve 1 grama. Tratado na fase inicial, seria facílimo de resolver”, disse o veterinário. “Mas os animais chegam com doenças em estágios bastante avançados, devido às condições financeiras dos proprietários.”
Os cachorros são de longe os animais mais atendidos no Publicão, representando de 60% a 65% dos pacientes, e os gatos respondem por quase todo o resto. Outros animais são bem mais raros no hospital – passarinhos, hamsters e até uma galinha com pedra no estômago já foram levados por donos em busca de socorro. As ocorrências incluem consultas novas e de retorno, mas dois terços dos atendimentos são de caráter urgente, como os cães atropelados que aparecem às pencas


fontehttp://revistapiaui.estadão.com

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